Ultraciclismo é mais do que pedalar por longas distâncias — é viver a estrada, dia e noite, sentindo na pele o cansaço, a paisagem mudando e a satisfação de ir mais longe do que você imaginava ser capaz. Para quem está começando, é natural sentir aquele frio na barriga e ter mil dúvidas na cabeça. E uma das primeiras é: o que eu preciso levar?
Essa pergunta parece simples, mas esconde um dos maiores desafios do ultraciclismo: montar um setup eficiente. Um erro comum entre iniciantes é querer levar “de tudo um pouco”, por medo de faltar algo. O resultado? Uma bike pesada, difícil de manobrar, cansativa de empurrar em subidas — e cheia de itens que acabam nem sendo usados. Outro erro é o oposto: levar de menos e sentir falta de coisas básicas como uma camada extra de roupa, comida suficiente ou ferramentas para pequenos reparos.
Neste artigo, vamos te ajudar a evitar esses extremos. A ideia é mostrar como montar um setup leve, funcional e estratégico — com o que você realmente vai precisar, de acordo com o tipo de pedal que vai enfrentar. Você vai entender o que faz sentido levar, o que pode ficar em casa, e como organizar tudo para ter acesso rápido durante o pedal.
Ultraciclismo exige preparo, sim, mas não precisa ser complicado. Com as escolhas certas desde o início, sua experiência pode ser muito mais tranquila, segura e prazerosa. Bora descobrir juntos como montar o setup ideal pra sua próxima grande aventura?
Princípios do Setup Ideal
Montar o setup ideal para o ultraciclismo é como fazer uma boa receita: não dá pra exagerar nos ingredientes, mas também não pode faltar o essencial. O segredo está no equilíbrio entre leveza e funcionalidade.
Leveza x Funcionalidade: o equilíbrio necessário
É tentador querer levar tudo “só por precaução” — ferramentas extras, roupas de todos os tipos, lanches variados, acessórios que “vai que eu preciso”. Mas quanto mais peso você carrega, mais desgastante o pedal se torna. Em longas distâncias, isso cobra um preço.
Ao mesmo tempo, simplificar demais e deixar itens importantes de fora pode te deixar vulnerável. Não é legal perceber, no meio da madrugada e no meio do nada, que você esqueceu uma luz reserva, um corta-vento ou um item básico de manutenção.
O objetivo é encontrar o ponto ideal: levar o mínimo necessário para ser autônomo, mas sem carregar peso extra que só atrapalha. E isso varia bastante de acordo com o tipo de pedal que você vai encarar.
A chave está em montar um setup leve, funcional e ajustado à sua realidade. Cada item deve ter uma função clara. Se for algo que “talvez você use”, pense duas vezes.
Adapte seu setup ao tipo de prova ou aventura
Não existe um setup “universal”. O que funciona em um Audax pode ser um problema num bikepacking solo e autossuficiente. O setup ideal depende muito do formato da sua jornada. Aqui vai um guia básico:
Brevets (como Audax): geralmente têm pontos de apoio e controle definidos, então você pode ser mais minimalista, levando o essencial para se manter entre um ponto e outro.
Bikepacking autossuficiente: aqui o buraco é mais embaixo. Você precisa prever alimentação, hidratação, abrigo e reparos. O setup tende a ser mais robusto — e exige mais planejamento.
Provas solo de longa distância: a autonomia é total, e cada parada precisa ser otimizada. Funcionalidade é tudo: o que estiver na bike tem que servir para algo real, e não só ocupar espaço.
Aventuras mais curtas ou em grupo: às vezes é possível compartilhar equipamentos ou contar com apoio, o que permite reduzir ainda mais o que vai na bike.
Prever imprevistos sem carregar a casa nas costas
A ideia é se preparar para os cenários mais possíveis, mais prováveis. Para isso, tenha sempre o essencial à mão — e evite o excesso de “e se”… O planejamento consciente reduz o risco sem sacrificar a leveza.
O ponto chave é estar preparado para os imprevistos que tenham mais possibilidades de acontecer, e não para todos os cenários possíveis. Um pneu furado, uma chuva inesperada, uma noite mais fria que o previsto — esses são exemplos de situações que você realmente deve considerar. Mas você não precisa levar, por exemplo, três tipos de luvas ou ferramentas que só usaria em uma oficina.
Fazer uma boa seleção de itens exige pensar em cenários reais e entender seus próprios limites. Com o tempo e a experiência, você vai afinar esse setup, trocando ou ajustando o que funciona melhor pra você.
O que levar: o essencial para encarar longas distâncias
Agora que já falamos sobre os princípios de um setup eficiente, vamos colocar a mão na massa: o que, de fato, você deve levar em uma aventura de ultraciclismo? A lista pode variar de acordo com o tipo de pedal, mas alguns itens são praticamente indispensáveis para qualquer longa distância.
Aqui, dividimos o conteúdo em três categorias: equipamentos da bike, itens pessoais e tecnologia/navegação. Cada uma cumpre um papel essencial na sua autonomia, conforto e segurança durante o percurso.
Equipamentos da bike
Bolsas de quadro, guidão e selim: são ideais para distribuir bem o peso na bike. A bolsa de quadro é ótima para itens de acesso rápido, como comida e ferramentas. A de guidão pode guardar roupas ou saco de dormir. A de selim é perfeita para itens mais volumosos e leves.
Ferramentas básicas e kit de reparos: leve um kit compacto com chave allen, espátula de pneu, remendos, bomba ou CO₂, uma câmara reserva e uma corrente sobressalente ou power link. Não é comum, mas quando algo quebra no meio do nada, você vai agradecer por estar preparado.
Iluminação dianteira e traseira: mesmo que o plano não envolva pedalar à noite, imprevistos acontecem. Uma lanterna frontal potente e uma luz traseira visível são fundamentais para sua segurança. Idealmente, tenha uma reserva para cada uma.
Carregadores e baterias extras: para provas ou travessias longas, o ideal é garantir fontes de energia sobressalentes. Opte por equipamentos que possam ser recarregados por USB e pense em como você vai recarregá-los ao longo do caminho.
Itens pessoais
Documentos, cartão, dinheiro em espécie: leve um documento com foto, cartão de débito/crédito e uma quantia pequena em dinheiro vivo — nem todos os lugares aceitam cartão, especialmente em áreas rurais.
Roupas apropriadas: invista em roupas de ciclismo confortáveis e respiráveis. Use o sistema de camadas: base térmica, segunda camada leve e corta-vento. Leve uma roupa extra compacta (seca e limpa) para emergências ou descanso.
Alimentação: leve lanches calóricos e fáceis de comer, como barras, castanhas, sanduíches e gel de carboidrato. Planeje também onde poderá reabastecer ao longo do trajeto — padarias, mercados e postos são seus aliados.
Hidratação: leve pelo menos duas caramanholas (ou uma mochila de hidratação, se preferir). Em roteiros mais remotos, um filtro portátil ou pastilhas de purificação pode ser a diferença entre seguir pedalando ou passar sede.
Tecnologia e navegação
GPS/ciclocomputador: ideal para seguir rotas com precisão, registrar o percurso e monitorar desempenho. Alguns modelos oferecem navegação por mapa e alertas de rota.
Powerbank: seu melhor amigo para manter tudo funcionando. Escolha um modelo com boa capacidade (10.000 mAh ou mais) e leve ao menos um cabo de carregamento confiável.
Celular com modo avião + apps offline: usar o celular apenas quando necessário ajuda a economizar bateria. Instale apps com mapas offline (como Komoot, Ride with GPS ou Maps.me) para garantir navegação mesmo sem sinal.
Mapas impressos (backup): parece coisa do passado, mas mapas físicos ou uma folha com pontos-chave do trajeto podem salvar em caso de falha total de eletrônicos.
Esses itens são a base de um setup funcional. O ideal é testar tudo em pedais menores antes de uma grande aventura, para ajustar conforme suas preferências e necessidades.
O que deixar em casa: peso morto no ultraciclismo
Se montar um setup eficiente é sobre equilíbrio, saber o que não levar é tão importante quanto escolher o que levar. No ultraciclismo, cada grama conta — especialmente após horas e horas de pedal. Itens desnecessários viram um fardo real, físico e mental.
É natural, especialmente para iniciantes, querer se “garantir” levando tudo que poderia ser útil. Mas o excesso de equipamentos acaba prejudicando mais do que ajudando. Abaixo, listamos alguns dos itens mais comuns que merecem ficar em casa.
Roupas em excesso
Levar roupas demais é um dos erros mais frequentes. Em uma jornada longa, é mais importante ter peças versáteis do que variedade. Pense em roupas que possam ser usadas em camadas, secar rápido e ocupar pouco espaço. Uma muda reserva (seca e limpa) já é o suficiente para emergências ou pernoites. Lembre-se: você está indo para pedalar, não para desfilar!
Itens de cozinha (em provas com apoio ou reabastecimento frequente)
Levar fogareiro, panela, talheres e utensílios de cozinha só faz sentido em aventuras totalmente auto suficientes e em lugares remotos. Se o trajeto passa por cidades ou vilarejos com frequência, vale muito mais a pena contar com restaurantes, padarias e mercadinhos. Além de poupar peso, você economiza tempo e esforço.
Câmera grande ou gadgets não essenciais
Registrar a jornada é incrível, mas pense bem antes de levar uma câmera DSLR, drone ou outros eletrônicos volumosos. O celular — com boa câmera e apps de navegação — já dá conta do recado na maioria dos casos. Qualquer gadget que só vai sair da bolsa uma vez ou outra pode virar um incômodo desnecessário no meio do caminho.
Equipamentos redundantes
Um segundo corta-vento, uma lanterna reserva da reserva, três tipos de lubrificante… É fácil cair na armadilha de levar “só por precaução”, mas esse tipo de redundância pesa — literalmente. Avalie com honestidade: você realmente vai usar dois itens com a mesma função? Em vez disso, invista em equipamentos confiáveis e versáteis, que atendam bem a mais de uma necessidade.
Ao revisar o que vai levar, pense: “isso aqui vai ser realmente útil ou estou levando por insegurança?” O setup ideal não é aquele que leva tudo, mas aquele que leva o necessário com inteligência. Quanto menos peso morto, mais leveza no pedal — no corpo e na mente.
Dicas práticas para montar e testar seu setup
Saber o que levar (e o que deixar em casa) é só o começo. Montar um setup eficiente exige prática e ajustes constantes. O que funciona para um ciclista pode não funcionar para outro — por isso, testar o setup antes da prova é fundamental. A seguir, algumas dicas práticas que vão te ajudar a montar, refinar e confiar no seu equipamento no dia da largada.
Faça testes em treinos longos
Não espere a prova para descobrir que a bolsa do selim encosta na roda, ou que o corta-vento é impossível de vestir pedalando. Faça treinos mais longos simulando as condições da sua aventura — distância, terreno, clima e horário. Carregue tudo como se fosse pra valer e perceba como sua bike se comporta. Essa é a melhor forma de identificar ajustes antes que virem problemas.
Ajuste sua carga com base na previsão do tempo e tipo de terreno
O que funciona em uma travessia ensolarada pode ser um desastre em uma prova chuvosa e fria. Sempre verifique a previsão do tempo e o perfil do percurso antes de decidir o que levar. Vai ter muito morro? Redobre a atenção no peso. Frio à noite? Priorize camadas térmicas leves. Adaptar o setup às condições específicas evita excessos e melhora sua performance.
Menos é mais: priorize itens multifuncionais
Ao invés de levar vários itens com funções diferentes, pense em versatilidade. Um corta-vento que também protege da chuva. Um cachecol tipo buff que serve de touca, máscara ou toalha. Uma meia extra que vira luva de emergência. Quanto mais multifuncional o item, mais espaço e peso você economiza — e menos bagunça precisa lidar.
Use listas (checklists) para não esquecer nada
Montar um checklist antes da prova é uma das estratégias mais simples e eficientes. Ajuda a organizar o pensamento, evitar esquecimentos e manter o foco na funcionalidade. Após cada pedal longo ou prova, revise essa lista: o que você usou de verdade? O que ficou de enfeite? Essa autoanálise é essencial para evoluir e ajustar seu setup com base na experiência real.
Lembre-se: o setup ideal não nasce pronto — ele é construído ao longo do tempo, com teste, erro e muita estrada. Com essas dicas, você evita os erros mais comuns e desenvolve um sistema que funciona do seu jeito, para o seu ritmo.
Conclusão
Montar um setup ideal para o ultraciclismo não é sobre ter o equipamento mais caro ou levar tudo o que cabe na bike. É sobre fazer escolhas conscientes, com base na experiência, no bom senso e no tipo de jornada que você pretende enfrentar.
Um setup enxuto e estratégico te ajuda a pedalar mais leve — no corpo e na mente. Te dá liberdade, autonomia e confiança para ir mais longe, mesmo quando os imprevistos aparecem. E isso não vem de primeira: exige teste, erro, adaptação.
Por isso, mais importante do que seguir uma fórmula pronta, é experimentar. Faça treinos com carga, revise o que funcionou, corte excessos, descubra o que realmente importa pra você. Com o tempo, seu setup vai evoluindo junto com sua resistência e seu estilo de pedal.
Se você já se aventurou por longas distâncias, conta pra gente nos comentários:
🧳 O que não pode faltar no seu setup?
🎒 Qual foi seu maior erro ou aprendizado?
💡 Que dica você daria pra quem está começando agora?
Vamos trocar experiências e crescer juntos nessa jornada de ir além, sempre com propósito e leveza. 🚴♂️💨